15 julho 2014

Carroça para quê te quero?

Tudo começou em agosto de 2013, aliás, tudo recomeçou ao observar pela janela do ônibus a constante presença de carroças carregando material de reciclagem pela cidade de Maceió. Não eram só carroças cheias de material, eram homens, mulheres, famílias inteiras puxando em seus braços suas carroças em meio ao trânsito caótico da capital alagoana.

- Essa imagem me deixa inquieto – dizia sempre que o encontro ocorria.
Bairro do Pinheiro, Maceió - AL
 Abril de 2014.

Vale destacar que além da força visual que a presença das carroças na cidade provocavam/provocam em mim, existe ainda a questão da sustentabilidade, porque é de lá que famílias tiram seu sustento, preservam o meio ambiente recolhendo o “lixo” produzido pela população da cidade e direcionando para instituições que recolhem e reciclam.
Mas a história da carroça não começa para mim em Maceió.
É em Viçosa - AL que encontro as primeiras carroças da minha vida. Sou filho de vendedor ambulante e durante muitos anos saiamos pelas ruas da cidade puxando nossa carroça com material para venda. Em Viçosa carroças estão espalhadas pelas ruas, enchem a feira no dia de sábado e  é nelas que homens e mulheres levam suas compras e materiais para venda.
Ao morar no sertão alagoano nos anos de 2000 e 2001 tive contato com um tipo diferente de carroça, os chamados “carros de bois” passando pelas ruas logo cedo com túneis de água acordando a gente com o ranger de suas rodas. Nunca esqueci o som das rodas e das carinhas tristes dos bois.
Em 2010, já estudando Teatro Licenciatura, mas ainda “morando” em Viçosa, sou convidado a participar do espetáculo de rua “A Merca do Rei” de autoria de Nathaly Pereira e Geuves Correia com a direção do professor José Aciolli Filho. Meu personagem andava no cortejo puxando um carrinho muito usado pelos vendedores de CD no centro de Maceió.
Em 2013 voltando do intercâmbio me vejo precisando de um reencontro com esse lugar e é a carroça que me conecta com o passado e o presente. É símbolo de deslocamento num ritmo muitas vezes contrário a correria da capital. Quando puxo a carroça da minha vida me desloco dentro do meu ritmo num espaço coletivo muitas vezes atropelado pela correria.
Para o teatro a carroça é símbolo de artistas mambembes, feiras, Commedia dell ‘ Arte no século XV quando saiam por muitos lugares para realizar seu oficio fazendo de suas carroças suas casas e/ou palcos improvisados. Carroça sempre esteve no teatro, seja no passado ou mais recentemente com o espetáculo “Brincante” de Antonio Nóbrega em São Paulo.
Em conversa com os catadores fui entendendo ao longo do processo o lugar da carroça dentro do espetáculo e uma coisa já me permito dizer: o espetáculo "Volante" tem um personagem que com sua carroça atravessa lugares, medos e memórias.
Para terminar um poeminha do lindo Mário Quintana que se permitiu "carroçar" pela poesia da vida, porque carroça é poesia no meio da fumaça cinzenta. 

 "Eu conduzo minha poesia como um burro-sem-rabo
Nesta minha Porto Alegre de incríveis subidas e descidas.
Suo como o Diabo
E desconfio
Que os meus melhores poemas terão caído pelo caminho…
Mas como saber quais são?!
Alguém por acaso os pegará do chão
E vai ficar pensando que o espantoso achado
Pertence a ele… unicamente a ele!"



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