03 fevereiro 2017

Por onde andamos...


Esse texto é para compartilhar com você sobre nosso processo de encontros na construção do espetáculo “Dona incelença da rua”.

Tudo começou assim...

Batatinha quando nasce...

Conversava sobre desejos e admirações teatrais com Gessyca Geysa quando ela me compartilhou uma de suas experiências que traziam uma reflexão sobre ressignificações do famoso “batatinha quando nasce...”. Isso ficou em minha cabeça durante muitos dias.
Era época do Festival de Teatro de Alagoas – FESTAL e nesse período nos aproximávamos dos trabalhos dos amigos e de públicos diversos que vinham assistir as peças.
O Coletivo Volante de Teatro pretendia construir seu próximo espetáculo exclusivamente para um palco de teatro, mas tudo foi mudando nesse período de novembro de 2016.
Nesse mês circulamos pelo SESC das Artes nas cidades de Limoeiro de Anadia, Feliz Deserto, Lagoa da Canoa, Piaçabuçu e Teotônio Vilela. O SESC – AL levou nosso primeiro espetáculo “Volante”, que dá nome ao coletivo, para espaços diversos das cidades visitadas. O encontro com os diversos públicos bateu no peito como uma vontade de ficar cada vez mais perto, mas os dias foram passando...
Durante o FESTAL assistimos “O Mamulengo do Ambrósio” do Coletivo Heteaçã e da Cia Armorial de Teatro de Bonecos. Quando acabou o espetáculo o peito batia com força querendo a rua, o espaço público mais uma vez e com mais força. Foi aí que veio a decisão por explorar mais a rua, a estética desse teatro, de se aproximar cada vez mais dele para entender a cidade e conhecer as pessoas.
Ok! Tinha uma primeira certeza: A próxima peça do coletivo continuaria pelos espaços alternativos e traria um estudo mais aprofundado sobre a estética do teatro de rua, mas que peça será essa?

Batatinha quando nasce.... 
Se esparrama pelo chão.

Foto encontrada em pesquisa na WEB.




Na noite de encerramento e festejo do FESTAL aconteceu um sarau em comemoração. Durante o sarau Magno Francisco, Professor de filosofia e militante da Unidade Popular – UP, pegou a palavra e começou a relatar para as pessoas sobre a morte da testemunha do caso de desaparecimento após uma abordagem policial do seu primo Davi da Silva. As palavras de Magno naquela noite me comoveram e fiquei por muitos dias com seu discurso na cabeça. Quando Magno entregou o microfone o cantor Rogério Dyas ia iniciar seu show, mas antes leu um cordel de sua autoria chamado de “O Mercado da Morte”. Pronto! Naquela noite eu não dormi. Fiquei inquieto pela casa como se fosse convidado a falar sobre o assunto. Nesse mesmo período a mídia começava a anunciar os dados do Mapa da Violência coordenado pelo professor e sociólogo Júlio Jacobo Waiselfisz. Alagoas, e infelizmente isso não é novidade para nós há muito tempo, está mais uma vez entre os estados em que mais se matam.
A madrugada do dia 27 de novembro foi para não dormir com todo esse barulho. Comecei a rabiscar no papel qualquer coisa sem sentido, mas que me ajudasse a extravasar o sentimento de tristeza, medo e indignação. Muitas questões vinham a mente nessa madrugada, inclusive o espaço em que moro há seis anos (Maceió), porque mesmo morando aqui durante esse tempo ainda tenho muitas dificuldades de respirar e entrar no ritmo da cidade.
Essa madrugada me fez entender que eu preciso respirar, mas que eu não preciso entrar no ritmo da cidade, porque ritmo pode ser construído, porque ritmo é pessoal, ritmo é experiência também. Não quero o ritmo que mata e ponto.

Como trazer um outro ritmo para cidade? Como trazer o nosso ritmo? Qual a origem do que tem nos matado? Como dormir bem, enquanto alguém morre durante o meu sono? E quando é o meu amigo que pode morrer? E quando é um familiar? E quando são os desconhecidos, porque eu me contento em me acostumar com a notícia? E se fosse eu morrendo agora?

São muitas perguntas.

Continua...

Por Bruno Alves
Ator e Dramaturgo do Coletivo Volante de Teatro

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