27 agosto 2014

Pode entrar!

Estamos caminhando na construção do nosso espetáculo.
Ontem recebemos a visita de pessoas muito queridas. Estiveram atentos e disponíveis a ouvir e partilhar sensações.

Nathaly Pereira, Igor Rozza, Bruno Alves, Elton Vinicius, Felipe de Alencar e o olhar de dona Alzira.

Bem perto do coração na nossa sala de ensaio contamos com a visita da Ednar que com sua companhia registrou em fotografias o ensaio.
A Nathaly Pereira do Grupo Clowns de Quinta ficou atenta e aberta anotando coisas e compartilhando conosco no final.
O Igor Rozza da Cia Insanos da cidade de Taquarana estava passando por perto e ficou para assistir nossas últimas cenas.
Dona Alzira chegou mais cedo ao local de ensaio do coral que faz parte e que ensaia na mesma sala que nós estavamos. Ficou conosco, tirou uma foto do grupo e partilhou palavras doces.
O processo continua. O texto está vivo!

02 agosto 2014

O que vem antes

Quero começar esse texto falando da vida que diz sim e da vida que diz não.

Nivaldo Vasconcelos registra a leitura desse texto que se refaz a cada encontro na Sala de Ensaio .

Fazem dois anos que não vivêncio uma temporada com espetáculo de teatro. Minha última experiência com sala de ensaio se deu nesse primeiro semestre de 2014 com a disciplina de Montagem Cênica. Dediquei grande parte desses dois anos a apreciação (porque amo ir ao teatro) e tive a oportunidade de assistir produções nacionais e internacionais.

Em maio de 2013 estive no Festival Internacional de Teatro de Rua em Santa Maria da Feira em Portugal. Foram dias de uma vivência teatral intensa com espetáculos dos mais diversos países. Vivi dias que me senti imensamente feliz com a experiência  de acordar para assistir teatro, comer vendo teatro, dormir pelo cansaço sabendo que ainda assim haveria teatro em algum ponto da cidade.

Estar fora de casa nesses seis meses de experiência de intercâmbio me ajudou a me perder e nesse caminho todo me encontrar. Confesso que o “se encontrar” tem sido a parte mais difícil, mas o se perder me ajudou a entender muitas coisas quando voltei para casa.

Voltar para casa me possibilitou receber muitos “nãos”. Sabe aquela pessoa que volta tão cheio de coisas para contar e compartilhar e que precisar gritar? Pois bem! Estava assim. Difícil foi entender que os outros estavam em outro momento e que o que me interessava não necessariamente interessava as outras pessoas, mas ninguém é obrigado a comprar nossas vontades, nós somos fazedores das nossas escolhas e entender isso me ajudou a prosseguir nessa estrada da vida, sendo volante da minha história.

O "não" foi difícil, mas me fez se aproximar do que realmente almejo para a vida. O primeiro ponto que me fez entender esse caminho que a vida vai tomando foi perceber que realmente quero viver teatro, poder fazer teatro a vida toda, pois foi a ele que dediquei meus últimos dez anos de vida. Poucos anos, pouca experiência, mas muita vontade de viver para sempre nesse universo.

Um dia desses encontrei com um amigo e ele me disse:
- Bruno estou dedicando tempo para fazer o que gosto. Estou vivendo uma faze egoista e estou gostando.
Entendi o que ele dizia, quando falava em fase egoísta, porque não era necessariamente uma fase de não se preocupar com os outros, mas uma fase de também se preocupar consigo, de tentar se ouvir mais e se fazer feliz.

Desde que voltei tinha uma vontade no meu coração: a de investigar, treinar, descobrir caminhos e fazer as coisas acontecerem, não queria mais ser um ator que fazia o que alguém dizia que deveria fazer, queria (quero) agora ser um “ator compositor” aquele que entende o que está fazendo, que é criador de seu processo, que colabora, que encontra respostas, que sabe o que está fazendo.
Mas por onde começar?

Ler foi a primeira tarefa. Selecionar leituras, relembrar e organizar exercícios aprendidos em oficinas ao longo da vida, fazer novas oficinas, entender o processo de criação de outros grupos, buscar a disciplina. Disciplina foi a palavra de ordem. Ter dias e horários na semana dedicados ao trabalho de treinamento de ator, mesmo que este fosse sozinho acompanhado do olhar da lente de uma câmera que tudo guardava para que eu pudesse assistir depois.

Comecei treinando sozinho. O treinamento é um fator muito importante e determinante para o ator. Fazia regularmente os exercícios, depois vinham as aulas de Teatro Licenciatura, inclusive a disciplina de Montagem Cênica, mostrando novas direções e em seguida entrei no Projeto Claricena, onde nos encontramos semanalmente para treinamento e descobertas para uma montagem futura.

Depois de receber “nãos” ao longo dos dias resolvi silenciar e dedicar esses dias de “chuva e não” ao treinamento e a observação dos sinais que a vida tem.

Caminhar por Maceió sempre foi uma tarefa que me permitiu observar a vida e o fluxo cotidiano. Sempre, desde que vim morar aqui, ver aquelas enormes carroças com homens puxando e cheia de material de reciclagem me despertava um sentimento de alegria. Confesso que a carroça era a coisa que mais me chamava atenção na cidade. Parece maluco achar uma carroça cheia de “lixo” a coisa mais bela de um lugar cheio de praias, mas para mim sim, era a carroça o oposto da vida na capital.

Vivi toda a minha vida em cidades pequenas, no interior do estado e lá é mais comum encontrar carroças pela rua, geralmente puxadas por animais como burro e cavalo, porém aqui o mais comum é encontrar homens e mulheres puxando carroças como forma de sobreviver e desacelerar essa cidade cheia de carros, pressa, shoppings e praias tão belas. E eu que venho de um lugar que não tem mar nem shopping center, “eu que não sei nada do mar” prefiro as carroças. Para mim era um susto imenso encontrar vida através desse símbolo caminhando por ruas onde é preciso ser metade gente e metade coisa para sobreviver.

É que para mim, enquanto ator, ver aquela carroça como um elemento cênico é também uma possibilidade de vê-la como uma extensão do corpo do ator- atuador. Como cidadão ver aquela carroça na rua é uma possibilidade de ver que no meio de toda essa correria da capital existe gente preocupada em viver, sobreviver e faz da preservação ambiental a sua forma de sustentabilidade e ai de nós se não fossem esses carroceiros, ai de nós se não tivessem esses que trabalham com a reciclagem da enorme quantidade de “lixo” produzido todo dia. E o lixo vem entre aspas por que eu fico questionando o que seria lixo, pois tanta coisa pode ser reaproveitada que lixo mesmo está na forma de olhar para as coisas. Aqui não vou falar (ainda) sobre as condições de trabalho, sobre as politicas publicas para essas famílias, quero que a experiência artística seja todo o discurso e poesia que resignifique esse objeto. Sei que é o trabalho que fazem é duro, honesto e lindo nessa nossa cidade e falo nossa cidade, porque quando vejo um carroceiro me identifico, me ligo a esse lugar. Essas carroças me fazem mais perto de Maceió, quando as vejo, quando as questiono me sinto realmente morando aqui.

Conversei com muitos desses senhores ao longo dessa pesquisa. Visitei os locais que fazem entrega do material, segui com o olhar seus passos pela rua, ouvi suas histórias de luta, conheci suas vidas, seus sonhos e o reconhecimento que tem sobre a preservação do meio ambiente. Conheci seu Milton, seu Manoel, seu Antonio, foram tantos homens muitas vezes calados, tantas vezes invisíveis, mas quando solicitados abertos a conversar tranquilamente.

Sabia que a carroça era o ponto de partida para a história que está nascendo. Sabia também que a inquietação inicial era essa coisa do pertencimento a um lugar, do estar num movimento que vai de encontro ao movimento da vida do próprio lugar. Entendi que não seria a história de um carroceiro, mas de todos nós enquanto seres humanos que carregam uma “carroça” invisível por todos os lugares que vamos. Esse espetáculo é essa busca pela felicidade que se reflete nessa nossa ida ao encontro do que acreditamos ser nosso. 

Essa carroça fica cada dia mais clara na minha cabeça como a alma cheia de história que temos, cheia de desejos, medos, decepções e sonhos que acumulamos e guardamos e perdemos ao longo do caminho. Era a minha carroça na estrada da vida, é a carroça do espectador que também carrega tantas histórias consigo, é a carroça dos queridos “Volantes” Nivaldo,  Elton e Felipe e outrxs que delicadamente ajudam a seguir. 

Sigamos!