21 setembro 2018

De 10 a 24/10 acontecerá o FESTAL!

Você sabia que de 10 a 24 de outubro vai acontecer a quarta edição do Festival de Artes Cênicas de Alagoas - @festal2018 ?

Serão 19 espetáculos + shows + Feira Criativa + Exposição sobre a Memória das Artes Cênicas de Alagoas + Trocas com escolas da rede pública + Mesas de Conversa + Críticas + Bate-papo sobre nossa produção ?

Pois é! Então se prepara, porque por aqui já estamos nos preparando.


O @festal2018 é um festival colaborativo criado e gerido por grupos e artistas de Alagoas.

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Dez anos da partida de Ronaldo Aureliano - por Bruno Alves


Fazem 10 anos da partida do professor Ronaldo Aureliano.

Não fosse o meu encontro com Ronaldo eu hoje certamente não faria teatro.

Essa coisa de ser ator não nasceu comigo. Eu aprendi com ele.

Lá em Viçosa, onde nasci, pulsa a etnocena. Posso lhe dizer que a espetacularidade das manifestações populares são sim a nossa primeira referência do estar em cena.

Eu sabia o que era um Reisado, um Guerreiro, um   Boi, mas esse negócio de teatro, essa palavra “teatro” assim como a usamos, eu não tinha ideia do que seria.

Quando eu tinha 8 anos, na Escola Municipal Conego Jatobá, o professor Ronaldo levou seu Grupo Teatral Riacho do Meio para apresentar seu espetáculo. Eu lembro daquela história ali encenada. Falava de violência doméstica, falava de coronelismo, questionava sobre coisas que eram estabelecidas como “normais” no nosso contexto. Tinha humor, tinha tristeza também. Eu entendi, nunca esqueci. Por isso acho estranho ainda hoje quando menosprezam o público achando que ele não vai entender.

Aos 16 anos ele me convidou para fazer uma oficina com ele e Roberta Aureliano, sua filha. Eu fui de resenha mesmo, querendo no fim das contas ver o que ele queria dizer quando tanto falava e fazia teatro na cidade.
Daquele dia em diante continuei a fazer teatro.

Mas não era só sobre fazer teatro que Ronaldo ensinava. Era sobre como ser um ser humano melhor nessa vida e principalmente como lutar para ter um mundo melhor.

Ronaldo quebrou a frase que sempre ouvi que “pobre tem que ficar no seu canto”. Ronaldo mostrou-me cantos, portas, caminhos, estradas.

E fazia isso quando me gravava fitas de discos que ele gostava para que eu pudesse conhecer, ou quando me emprestava livros, ou quando marcava para que eu fosse assistir filmes e shows no vídeo cassete, porque em casa eu não tinha.


Fez isso quando olhou para mim e tantos amigos e amigas e disse que nós podíamos. Que éramos capazes. Fez isso quando nos mostrou que injustiças sociais e ausência de direitos deviam ser combatidas. Fez isso quando transformou os ferros da estação ferroviária em obras de arte. Transformou tanto ferro em arte. Fez da gente ferro, para ter força e resistência para fazer arte.

Essa oportunidade que me deu eu serei sempre grato, sempre!

Sua partida em 2008 foi impactante. Morreu ao tentar salvar um estudante na cachoeira. Só fui uma vez naquela cachoeira depois disso. Fiquei com o coração desolado. Era difícil olhar para aquelas ruas e não encontrar seu sorriso, suas críticas e seus incômodos.

Esse ano no Festival de Artes Cênicas de Alagoas – FESTAL, celebramos a memória das nossas artes cênicas. Ronaldo é minha memória mais preciosa.

Ronaldo ainda está aqui, eu sei. E vai estar em cada passo que eu der.

Sinto sua falta, professor.

Com amor, para sempre.

Bruno Alves

18 setembro 2018

Sobre Volante na Gazeta Web.



Saiu esses dias uma matéria cheia de carinho e afeto sobre a trajetória do Coletivo Volante de Teatro feita pela jornalista Greyce Bernardino.

Greyce quis saber um pouco sobre a trajetória do espetáculo "Volante" pelos bairros de Maceió  nesses últimos anos e aproveitou para falar de outros trabalhos nossos nesses últimos quatro anos.

É muito gratificante poder compartilhar sobre a nossa caminhada e aprendizado nessa jornada, escolha de vida, resistência e amor que cercam o nosso fazer teatral.

Conversar com ela foi também uma possibilidade de revisitar caminhos, inseguranças, perceber os lugares que começam as inquietações, a necessidade de contar nossas histórias e principalmente fortalecer essa escolha que nos move.

Estamos aqui nesse quarto ano de Coletivo. Ainda muito novinhos, mas com bastante sede de aprender e recomeçar sempre que for preciso.

Nós agradecemos a Greyce por esse espaço de troca e compartilhamento.

Gratidão, Greyce!

Leia aqui:


17 setembro 2018

Sobre o filme "O caso do homem errado" por Rayane Góes

Sobre o  filme O Caso do Homem Errado. 


Eu Rayane Goés, Sou Feminista, sou militante atriz e também gestora do Coletivo Volante que é sediado aqui na cidade de Maceió. Temos o  espetáculo "Incelença", que fala sobre o genocídio negro na voz dessas mães que perderam seus filhos vítimas  da violência polícia. Minha luta se faz muito através de "Incenlença". Faço Teatro e uso a minha arte na labuta diária para o mundo não mudar quem sou. Nós do Coletivo Volante usamos nossa arte para o mundo não mudar quem somos.  E sim, também usamos nossa arte para nos posicionarmos e lutarmos pelo que acreditamos. Me sinto feliz e contemplada quando vejo em outras esferas artísticas uma obra de arte que é também ferramenta de luta das mazelas diárias de nossa realidade. 
Ontem dia 16 de setembro tive a oportunidade de assistir a esse filme " O caso do Homem errado" da diretora Camila de Moraes,  após o filme o debate com a diretora, no Espaço Arte Pajuçara. 
E por tudo isso acredito que esse filme é de extrema importância. É essencial para que todos assistam, pois ele traz um caso de assassinato de um jovem negro, Júlio César de Melo Pinto, nos anos 1980. Mas casos assim acontecem todos os dias em várias partes do Brasil. Acontece todos os dias em Alagoas, em Maceió. Estão matando nossos jovens negros. Estão exterminando nossos jovens negros. A cada 4 mortes por minuto, 3 são negros e em sua maioria vítimas da violência Policial, vítimas de um sistema corrupto e de uma estrutura de poder branca.
 A partir de quinta-feira dia 20/09, no Arte Pajuçara, às 19h, começará a exibição desse filme potente e essencial. Um filme independente e de grandiosa importância social e militante. Vamos fazer com que filmes assim, ocupem esses espaços. Ele ficará uma semana em sessão. Mas precisa de público para permanecer mais semanas. Cada pessoa só tem a ganhar assistindo esse filme.  Filme de uma diretora negra guerreira, #camilademoraes , que vem lutando por esses espaços, por seus direitos, por seus lugares de fala. E pelo direito do seu povo em viver, ser, falar e estar onde quiserem estar.  Gratidão, Camila Moraes, por sua arte necessária em nós.
Por: Rayane Góes
#ocasodohomemerrado



Sobre o  filme O Caso do Homem Errado. 

Sinopse: Júlio César de Melo Pinto, o operário negro que foi executado em Porto Alegre pela Polícia Militar, nos anos 1980. A história do jovem é contada através de depoimentos como o de Ronaldo Bernardi, o fotógrafo que fez as imagens que tornaram o caso conhecido, o da viúva do operário, Juçara Pinto, e de nomes respeitados da luta pelos direitos humanos e do movimento negro no Brasil. (Sinopse tirada da página Adoro Cinema)

 A partir de quinta-feira dia 20/09, no Arte Pajuçara, às 19h, começará a exibição desse filme potente e essencial. Um filme independente e de grandiosa importância social e militante. Vamos fazer com que filmes assim, ocupem esses espaços. Ele ficará uma semana em sessão. Mas precisa de público para permanecer mais semanas. Cada pessoa só tem a ganhar assistindo esse filme.

Da diretora: #camilademoraes 
#ocasodohomemerrado





16 setembro 2018

Seguimos Confluindo

Voltamos de mais uma vivência do Projeto Confluências do @sescalagoas 

Foram três dias de imersão na cidade de Arapiraca. Muitos encontros, trocas, afetos e aprendizados.

O Projeto #Confluências2018 é o encontro de 20 artistas alagoanes de diversas linguagens para pensar e construir um projeto artístico coletivo para o nosso estado.


Estamos felizes com esses momentos vividos e oportunidade de trocas tão valiosas.

Sigamos!





#Sesc
#Alagoas
#Arapiraca
#Maceio
#Arte

11 setembro 2018

Sobre encontros e experiências na Aldeia Arapiraca 2018

Esses afetos me afetaram, é fato. Respirei arte, me inspirei de criatividade, bebi dos saberes populares. Fui contagiada por sorrisos, conversas, danças, brincadeiras e bordões.


Foi uma semana em que  a escrita da crítica sobre arte não veio só como registro, o que é fundamental, mas também como um intercâmbio com o público e os artistas, mostrando opiniões a fim de gerar discussões sobre a obra, mostrando linhas de pensamentos de forma analítica, mas buscando uma linguagem comum, para assim trazer uma reflexão aos artistas sobre seu trabalho e mostrar uma outra leitura do espetáculo ao público.







Ampliei o olhar, exercitei a escuta que agora está mais aguçada. Me permiti aprender e ser atravessada por estados e coisas. Me permiti ser atravessada pelo encontro. E agora sou outra e me gosto mais. Estou  imersa na presentificação das possibilidades, estou aberta a oportunidades, estou aberta ao universo. Quero sempre ser outras a buscar os encontros da vida como ser volante que sou, como @coletivovolanteteatro que somos.

Agradeço ao que tenho, ao que experienciei e a tudo que ainda está por vir.

Rayane Góes





08 setembro 2018

Sobre encontros e afetamentos no I Festival Alagoas Criativa


Débora me enviou uma mensagem convidando o coletivo para participar de um painel intitulado "Negócios que são espetáculos" e compartilhar um pouco sobre empreendedorismo em Artes Cênicas no nosso estado durante o I Festival Alagoas Criativa organizado pelo Sebrae-AL.

Aceitamos o convite.





Ao longo dos dias que antecederam o festival muitas inquietações surgiram e perguntas do tipo: “Mas é para falar sobre o quê? ”, "Somos empreendedores?".

Essas perguntas começaram a surgir quando comecei a pensar sobre o empreendedorismo, confesso que nunca tinha parado para pensar nesse empreendimento de vida que é o nosso trabalho com o coletivo. Talvez eu não tivesse respostas suficientes de perguntas do tipo: “Como fazer para sobreviver com Artes Cênicas em Alagoas?”. Essa, confesso mais uma vez, tem sido a pergunta que mais temos tentado responder nesse ano de 2018, porque tem aparecido muita gente nos perguntando isso.

Fui de coração aberto levando mais perguntas e inquietações do que respostas, até por que as respostas nós ainda estamos buscando e todas as perguntas que nos cercam tem nos movido a caminhar e dar um passo de cada vez.

Dentro de mim não haveria uma fórmula para ser compartilhada ou um modelo de como fazer. Nós não temos uma forma fixa na nossa criação, essa vai se moldando, se desconstruindo a cada encontro e descobrindo outras possibilidades a cada dia. Somos um coletivo jovem, quatro anos de caminhada, consideravelmente pouco tempo.

André Lira mediou o painel.

O mais legal de ter participado desse painel foi saber que lá encontraria pessoas que empreendem tempo de suas vidas na construção de coisas que as movem. Lá, nesse dia 01/09, estava para nos receber André Lira, representante do Festival e mediador do painel, e também Djaelton Quirino, ator do Teatro de Retalhos da cidade de Arco Verde – PE.

Conheça mais do Teatro de Retalhos AQUI!

Antes de começar o painel Djaelton e eu conversávamos sobre trajetórias e ele me contava histórias do Teatro de Retalhos que vem desde 2008 realizando um trabalho muito belo por Pernambuco.

As duas fotos são um registro de Elaine Lima.

Quando começou o painel falei um pouco sobre a trajetória do coletivo, das questões de precariedade que muitas vezes encontramos durante nosso processo de criação, da falta de espaços alternativos para arte na cidade, mesmo com tantos prédios e casas abandonadas. Falei que vamos encontrando em atividades paralelas (oficinas, aulas, dentre outros) espaço de sustentabilidade da nossa vida. Falei da ausência de políticas públicas para a cultura dentro do nosso estado, da falta de leis de incentivo. Falei também do pouco interesse do setor privado em apoiar muitas ações, pois estes muitas vezes estão sempre visando grandes produções e geralmente grandes produções do eixo sul e sudeste quando passam por aqui. Falei que dentro do coletivo vamos construindo nossos figurinos, buscando outros espaços, produzindo nossas peças, fazendo e aprendendo aos poucos a fazer as funções que poderiam ser feitas por outros profissionais.

Sobre algumas dessas questões eu tenho entendido como sendo parte da nossa narrativa, esse fazer artesanal, esse espaço de autonomia que lutamos diariamente para manter caminhando.

Djaelton contou-nos sobre como é fazer teatro em Arco Verde. Falou-nos de como o grupo foi importante para sua permanência dentro da cidade. Eis uma questão que bateu forte comigo, pois fazem sete anos que deixei minha terra natal, Viçosa – AL, para buscar outros caminhos, pois os pouquíssimos que tinham por lá começavam a se fechar. Houvesse uma política pública cultural dentro do nosso estado certamente eu teria ficado mais tempo em Viçosa, ou talvez não tivesse saído, mas enfim, as coisas nem sempre são como a gente imagina e também sou muito feliz de estar em Maceió e tendo a oportunidade de dialogar e construir o caminho do coletivo, coisa que talvez não acontecesse por lá, não dessa maneira, com essas pessoas e esse espaço cidade grande que tanto nos provoca.

Conhecer a trajetória do Teatro de Retalhos foi fortalecedor e inspirador.

A plateia participou, trouxe questões para dentro do painel, uma moça da plateia era de Arco Verde, mora aqui em Maceió agora, e emocionada nos contou a importância do Teatro de Retalhos na sua vida e formação. Ouvindo aquele depoimento emocionado, também reascendeu em meu peito muita esperança, porque no fim das contas a gente com esse nosso teatro está buscando chegar no coração das pessoas. É sobre afetos que falamos. O que nos afeta e o que afeta o todo.

O Festival me fez também entender que como coletivo somos sim empreendedores, estamos construindo pontes e caminhos o tempo todo para esse nosso ofício.

O Festival foi também um caminho que se mostrou como espaço de diálogo, trocas e fortalecimento.

Nós agradecemos a oportunidade!

Bruno Alves

04 setembro 2018

Sobre encontros e afetamentos de "Incelença" em Arapiraca - AL.


Há dois anos atrás íamos a Arapiraca pela primeira vez com o Coletivo Volante de Teatro para apresentar no meio de uma praça o nosso primeiro espetáculo, o “Volante”, que dá nome a esse coletivo.

Deslocar-se facilmente, atirar-se, buscar habilidades para o voo.... Isso é o que nos propõe esse nome que o coletivo recebe, isso tem sido também a nossa busca e missão.
Deslocar-se facilmente e atirar-se em busca de uma proximidade com um público desconhecido, seja ele quem for, seja aonde estiver.

O projeto Aldeia Arapiraca do SESC AL nos proporcionou esses momentos, pois no dia 02 de setembro de 2018 estávamos lá pela segunda vez para reencontrar esse público e se lançar nos braços de um outro público que não conhecíamos.

Em 2016, ano em que iniciamos a montagem do espetáculo “Incelença”, Alagoas aparecia com 6 das 20 cidades mais violentas do Brasil nos dados do Mapa da Violência elaborado pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso). Nesse mapa Arapiraca era a 18º cidade mais violenta para se viver no Brasil. Vale ressaltar que esses dados são de 2016.

“Incelença” parte dessa inquietação com esses dados e o constante aparecimento de Alagoas entre os lugares mais violentos para se viver.

Recentemente um levantamento feito Datafolha e divulgado pelo jornal Folha de S.Paulo no dia 21 de agosto desse ano mostrou que o governo alagoano está entre os estados mais ineficientes do País na relação entre recursos financeiros e cumprimento de políticas públicas. Leia mais AQUI!


Estávamos em Arapiraca para falar sobre essas vidas e não podemos de deixar de falar que são vidas de jovens negros e periféricos. E não podemos esquecer que por aqui, nesse estado, a cada 13 pessoas assassinadas por ano, 12 são negras e periféricas.

O SESC AL escolheu para nossa apresentação a Casa de Caridade de Candomblé Ilê Axé Dará Xangô Oya, uma ong localizada no Bairro da Vila Contente que tem como liderança o Pai Alex. 

Aqui em Alagoas as Casas de Ilê Axé possuem um trabalho forte e socialmente importante dentro dos bairros periféricos, pois em sua maioria estão localizadas dentro dessas periferias e realizam trabalhos espirituais e sociais de acolhimento e construção de dignidade humana e autonomia. Cada Casa dessas, visto que conhecemos algumas também aqui em Maceió e Viçosa, lugares que temos mais acesso, possuem esse trabalho tão importante.



Saíamos em direção a Vila Contente, no caminho estrada sem asfalto, uma estrutura de amontoado de sucatas, dentre outras coisas.

Crianças brincando na rua.

Fomos recepcionados por Sandra, esposa do Pai Alex, e quem coordena muitas ações dentro do espaço. Sandra nos acolheu de coração aberto. Esteve ao nosso lado o tempo todo e cuidando para que nos sentíssemos em casa. A ONG Casa de Caridade é um espaço lindo.

Foto de Fernanda Vasconcelos


Pai Alex chegou. Acolheu-nos, fez algumas perguntas e retirou-se. Soprou no ar fumaça de bênçãos, proteção e retirou-se.

Continuamos pelo tempo respirando as energias boas daquele lugar. Dentro de mim habitava uma felicidade por estar ali, porque algo me dizia que algo aconteceria e nos afetaria de alguma forma.

Pai Alex retornou mais uma vez. Observou nosso material de cena espalhado pelo chão e direcionou seu olhar a uma matraca que usamos. Foi direto ao objeto e nos contou:

“Eu sou o último encomendador de almas da região”.

Contou-nos a história da matraca em sua vida, contou para que era usada, quem a usou, e sua importância em um contexto um pouco esquecido de muitos de nós. Falou-nos dos cantos das incelenças, rememorou muitas coisas, presenteou-nos com essas memórias e retirou-se mais uma vez para só retornar quando iniciássemos nossa missão.

As crianças iam e vinham dentro do salão. Sandra já mobilizava a comunidade para que vinhessem pela noite assistir. Para as crianças ela dizia:

“Só entram se trouxerem um adulto para acompanhar”.

E ali naquelas palavras iniciou-se também a missão das crianças de convencer um adulto para trazê-las para assistir.

“O Helicóptero da polícia vem por aqui direto”, falava-nos Sandra.

Aos poucos contava-nos de mães que perderam seus filhos e filhas e do constante crescimento da violência naquele espaço.

“Incelença” já havia começado desde o momento que pisamos naquele chão.

Anoitecia na Vila Contente.

Pessoas de outros bairros da cidade, ou “pessoas da rua” como costumam chamar as pessoas de outros bairros os moradores da Vila Contente, vinham em seus carros e caronas para assistirem ao espetáculo. Algumas perguntavam “temos que esperar a peça começar aqui fora mesmo?”.

A comunidade se aproximava do portão de entrada para o espetáculo.

“Incelença” aconteceu. Salão lotado.

Foram 50 minutos de espetáculo.

Foram 2 horas de conversa com o público.




Pai Alex compartilhou conosco sua história como encomendador de almas. Contou-nos a história da Vila Contente, que ainda é conhecida como “Cabaré Velho”, mas que seu primeiro nome sempre foi “Vila Contente”.




Falou-nos sobre a violência no bairro e principalmente sobre a violência na cidade. A exclusão e a marginalidade da “Vila Contente” dentro da cidade de Arapiraca.

Foto de Lili Lucca


Houve uma explosão de depoimentos e inquietações no público presente. As pessoas que assistiram a peça continuavam ali para falar sobre seus cotidianos.

Foto de Lili Lucca



Pai Alex dizia:

“Essa mãe daí da peça que lava a roupa mora aqui.

Essa mãe da feira também mora aqui.

Essa mãe que procura a filha mora aqui também”.

No meio desse turbilhão estava Zilma.

Zilma perdeu seu filho para a violência.

Zilma estava ali o tempo todo assistindo, escutando.

Zilma vibrava dentro de nós.

Uma hora quando alguém da plateia, que não mora na Vila Contente, compartilhou que a partir daquele momento olharia criticamente a situação da violência em sua cidade e que antes não havia prestado atenção ou dado importância as coisas que aconteciam com pessoas negras e periféricas.

Zilma olhou para a pessoa e perguntou duas vezes:

“Você nunca se colocou no lugar outra pessoa?

Você nunca se colocou no lugar de outra pessoa?”.

Pai Alex com a ajuda de um senhor cantou-nos duas incelenças.

Zilma permaneceu por ali escutando. Levantava. Fumava um cigarro e voltava a sentar conosco.

Foram cerca de três horas com a gente ali se olhando no olho, construindo um novo olhar sobre as coisas, desconstruindo olhares, permitindo-se estar errado, reconhecer nossos erros, nossos privilégios e tentando entender algo além do que mostrou ali na peça.

Estávamos na Vila Contente rodeados com mães como Zilma que carregam a dor de perder alguém que colocou no mundo.

Incelença para nós ganha novos caminhos a cada encontro como esse.

Incelença é para Zilma.

E Zilma pergunta a mim e a você:

“Você nunca se colocou no lugar de outra pessoa?

E o que a gente faz quando o encontro com o outro nos afeta e nos pede uma reação a tudo isso que está aí exposto na nossa cara, no nosso lado?

Bruno Alves